A carne bovina argentina é melhor que a brasileira?
11/11/2013

A carne bovina argentina é melhor que a brasileira?

A história da pecuária no Brasil pode ser dividida em dois ciclos. O primeiro começou no século 16, quando bois foram trazidos para o país para mover engenhos de açúcar. Foi no século 20 que começou o segundo ciclo, aquele que transformou o Brasil no maior exportador de carne do mundo.
Nessa hora, um personagem foi fundamental, o gado zebu, como o Nelore, aquele de pelo branco com uma corcova, que, originário da Índia, adaptou-se perfeitamente ao calor do Centro-Oeste brasileiro. Com a conquista da região e uma raça “pau para toda obra”, o rebanho se multiplicou.

O porém do zebu sempre surge na hora em que a carne chega ao prato: os bifes extraídos dos animais de origem asiática não são exatamente top de linha. É por isso que os turistas brasileiros se maravilham quando comem seu primeiro bife de chorizo na Argentina. O gado por lá é, sobretudo, da raça escocesa Angus, que se dá bem em climas frios e tem, por diversas razões, uma carne melhor.
Quem volta ao Brasil para o contrafilé do dia a dia acaba repetindo a velha pergunta feita antes por milhões de turistas em situação parecida: quando o Brasil vai ter uma carne tão boa? Felizmente, há sinais de que a pecuária brasileira está entrando num novo ciclo, nossa carne, finalmente, começou a melhorar.
A responsável por isso é a genética. Há dez anos, um grupo de criadores na­cio­nais começou a cruzar espécimes dos gados Nelore e Angus. O objetivo da em­preitada era chegar a um gado com a resistência do primeiro e a carne quase tão boa do segundo. Aos poucos, foi dan­do certo.
O DNA escocês, que até então só prosperava no sul, espalhou-se pelas regiões Sudeste e Centro-Oeste. O número de abates anuais cres­ceu 20 vezes em dez anos. E as vendas de sêmen da raça saíram de zero para mais de 3 milhões de doses por ano. Em 2013, nove em dez bezerros gerados em cruzamentos industriais por aqui terão sangue angus. Hoje, esse rebanho representa 5% do total no país. E o número tende a crescer dramaticamente.

Gordura entremeada

Talvez a principal diferença entre o novo boi brasileiro e o velho zebu de sempre esteja na parte dianteira, de onde se extrai a chamada carne “de segunda”.

Cortes nobres de zebu, como o filé-mignon ou a picanha (extraídos da metade traseira), são macios, é verdade, embora não tenham o sabor conferido pela gordura entremeada, típica de raças britânicas, como angus e hereford. Mas a coisa complica mesmo nos cortes dianteiros, como acém e paleta.
Tudo isso se tornou, no Brasil, aquele tipo de carne que o cozinheiro joga na panela e só tira depois de longa exposição ao calor tenha destruído as fibras (ponto em que a carne “desmancha”). Com a chegada da nova genética, isso muda.
A gordura entremeada(marmoreio) melhora, sim, os cortes nobres. Mas o principal salto se dá nos acéns. “Todas as carnes de Angus podem ser de primeira”, “Desde que o churrasqueiro também seja.”
As empresas têm alardeado o avanço da carne Angus nos supermercados, e cobrado, claro, mais caro por ela. Os preços são cerca de 30% maiores, até mesmo bifes de patinho e coxão duro, algo impensável com a carne típica brasileira.
Os carnívoros mais tinhosos sempre dirão que falta ao gado mestiço o “buquê do pampa”, uma referência aos sabores típicos do angus puro criado no friozinho das planícies de Uruguai, Argentina e Rio Grande do Sul. Mas talvez a ambição nem deva ser essa, já que um boi angus jamais sobreviverá à vida dura do cerrado.
A evolução do gado brasileiro, dentro dos limites do possível, é uma ótima notícia. Que merece ser comemorada com um churrasco de acém.