Em qualquer hipótese, o setor cresce
19/01/2012

Em qualquer hipótese, o setor cresce

Mesmo com crise externa, menor confiança por parte do consumidor, o setor de supermercados pode se valer de sua gênese, de ser o ponto de abastecimento da maior parte da população e aquele que encontra soluções principalmente nas adversidades

Por Celia Demarchi
O setor supermercadista brasileiro deve ter em 2012 desempenho semelhante ao obtido em 2011 — e crescer algo em torno de 3,5% a 4%. Pelo menos até o fi m deste ano, os analistas não enxergavam ameaças à expansão das vendas no horizonte. Exceto se a crise europeia atingir proporções alarmantes no curto prazo com eventual colapso da Grécia (e sua saída da zona do euro), o que provocaria uma recessão global que, aí sim, afetaria também o Brasil.
Para Sérgio Rodrigo Vale, economista-chefe da MB Associados, a grande pergunta é: a Grécia (leia-se o povo grego) vai ou não suportar as medidas de austeridade impostas pela UE para os próximos anos? Ainda que o país decida rejeitá-las, porém, provavelmente não o faria no curtíssimo prazo, na opinião de Vale: “O cenário básico sugere novas rodadas de ajuda”.
Essa avaliação leva o economista a estimar expansão do PIB nacional em cerca de 4% em 2012, acima, portanto, do previsto para 2011, que, segundo as projeções mais otimistas, ficaria em torno de 3,5%. Tharcísio Souza Santos, diretor da Faculdade de Administração da Faap, acredita que a economia brasileira crescerá no máximo 3,1% em 2011, e, apesar de crise global — ou até em consequência dela —, obterá desempenho um pouco melhor em 2012, com taxa de expansão de 3,5%. É um índice semelhante ao projetado por José Milton Dallari, economista e consultor da Abras. “Será um resultado fraco, mas alvissareiro em relação ao desempenho ruim das economias desenvolvidas”, diz Santos. Todos com previsões acima da apontada pela Consultoria Rosenberg (veja artigo), porém dentro da mesma faixa.
Ou seja, de todo modo, a economia brasileira continuará em expansão. O crescimento modesto decorrerá, como em 2011, da derrocada da comunidade europeia, independentemente de sua profundidade, pois o bloco é o segundo maior parceiro comercial do Brasil. As exportações do País devem se reduzir também porque a China, principal destino dos embarques brasileiros, já dá sinais de que seu ritmo de crescimento declina.
O mercado interno deve garantir, porém, a manutenção da taxa de emprego, comparativamente a 2011 e, ainda, a estabilidade dos salários, que não devem crescer, em especial na indústria, como estima o IBGE. Já a renda nacional, apesar disso, deve continuar em ascensão porque terá prosseguimento o processo de distribuição (lento, para Santos), via programas sociais e por meio do aumento do salário mínimo para R$ 620,21, com o reajuste já anunciado de expressivos 13,6% para 2012. O reajuste terá forte impacto na renda familiar, principalmente no Nordeste, onde cerca de metade da população sobrevive de benefícios sociais em suas várias modalidades, segundo Vale, e gasta a maior parte do que recebe na compra de alimentos, para alegria dos supermercadistas.
Possível benefício
Há certo consenso ainda sobre a possibilidade de o setor de supermercados até se beneficiar da crise internacional em 2012. Para Vale, essas empresas podem usufruir inclusive de quedas no índice de confiança do consumidor, provocadas pelo noticiário econômico diariamente pontuado pela palavra crise. Isso porque, ele explica, nesse caso, o brasileiro deve comprar cada vez mais alimentos nas prateleiras dos supermercados e se afastar dos restaurantes, onde os preços tendem a subir, influenciados pelo reajuste do salário mínimo, base da remuneração de boa parte dos funcionários deste último setor: “Durante as crises e períodos de baixo crescimento econômico, o consumidor se volta para o básico”.
Além disso, os preços dos alimentos deverão ficar estáveis, uma vez que a demanda da China tende a declinar, ainda na avaliação de Vale, ao mesmo tempo que o ritmo de
expansão chinesa se reduzir. Mas o Brasil pode se beneficiar inclusive da necessidade da China, assim como dos demais países emergentes, de estimular o mercado interno para compensar a queda das exportações às decadentes economias ricas, como raciocina Santos: “Para dar fôlego às vendas domésticas, a China continuará dependente de commodities como ferro, petróleo e grãos dos quais o Brasil é um dos maiores fornecedores”. Ou seja, pelo menos as exportações de commodities não devem cair tanto, embora os preços desses produtos declinem em decorrência da demanda mais baixa.
Dallari ainda lembra que brasileiros das classes A e B, que detêm atualmente em torno de 38% da renda nacional e ganham por mês mais de 10 salários mínimos, têm consumo diversificado. Mas os que pertencem à classe C, com cerca de 52% da renda (de até R$ 2.300 mensais), não conseguem poupar e direciona seus recursos ao consumo de produtos básicos, como alimentos. E a classe C, afirma ele, vai continuar crescendo. Até 2014 concentrará aproximadamente 55% da renda nacional.
Com a renda em ascensão, o provável é que o brasileiro da classe C compre cada vez mais alimentos de maior valor agregado, de acordo com Dallari, tendência já observada em 2011. Esse fato leva a crer que 2012 poderá ser palco de disputa ainda mais acirrada entre as empresas por essa camada da população.
Nesse cenário, controlar custos adquire importância capital, segundo Vale, já que a concorrência se concentrará em especial nas categorias de produtos alimentícios não básicos. Para Dallari, o momento exigirá muita criatividade dos empresários para fazer promoções, principalmente em datas comemorativas, mas também para atrair o consumidor para as lojas no dia-a-dia, por meio de estratégias como melhoria do ambiente, da disposição dos produtos nas gôndolas e do abastecimento eficiente, com o mínimo possível de rupturas.
Dallari enfatiza a necessidade de melhorar o atendimento, lembrando que o público de cada loja é diferente, conforme a localização, e que a rapidez e a facilidade para comprar são quesitos sempre valorizados pelo consumidor.
Em resumo: “É preciso continuar investindo em tecnologia, qualificação, promoções”. Enquanto Dallari, porém, não enxerga “volúpia” por compras de empresas médias ao menos nos próximos dois anos, quando os investidores deverão estar avaliando os rumos da crise global, Vale aconselha as empresas nacionais a ocupar cada vez mais os espaços que o crescimento econômico vai abrindo no mercado interno.
Ele explica que a capacidade de sobrevivência das cadeias de menor porte vai se tornar ainda mais difícil à medida que o mercado brasileiro se mostrar resistente à crise, despertando ainda mais o interesse das empresas estrangeiras.
Para Vale, o setor deve cuidar principalmente do controle de custos e avaliar a possibilidade de expansão em novas praças: “A concentração no setor vai aumentar nos próximos anos e com isso os preços ficarão cada vez mais baixos”.
As empresas menores, diz Vale, têm de olhar para as regiões que crescem, como o Nordeste, onde a renda familiar vai continuar subindo, puxada pela política de aumento do salário mínimo, e também em decorrência de investimentos públicos e privados, principalmente em polos de desenvolvimento como o formado ao redor do Porto de Pecém, em Recife, Pernambuco. Mas os supermercadistas também precisam olhar para as velhas metrópoles, como São Paulo e Rio de Janeiro, cujas fronteiras vêm sendo esticadas ano a ano pelo mercado imobiliário, que já não encontra espaço para erguer seus empreendimentos nas regiões nobres.
Vale cita a região do ABC paulista e bairros como Ipiranga e Barra Funda, em São Paulo, e a zona norte carioca, que se expande graças aos investimentos em cursos para as Olimpíadas de 2016: “Há muitas regiões ainda não exploradas”.